sábado, 7 de novembro de 2020

Memórias Infrigidas

Sempre que lembro da infância e comento com alguém ouço: "bons tempos, tivemos umas boa infância". Não é, bem assim, comigo. Toda vez que tento resgatar minhas minhas memórias eu rompo um band-aid de algum trauma. Lembro que aos meus 5/6 nessa foto de formatura do ABC eu ja tinha passado por várias coisas que nenhuma criança deveria ter passado, alias, ninguém deveria ter passado. Eu sempre ouço de todo mundo que me viu na infância que eu era uma criança inteligente, agitada, danada... Acho que ninguém, de fato, entende os motivos de minhas danações e agitações. Na mesma época da formatura eu lembro de ter sofrido uma tortura, eu fui trancado numa sala escura, sozinho, pelo simples fato de não me comportar. Eu, uma criança de 5 anos, no máximo, trancado em um almoxarifado, "castigado" por não abodecer, não saber ficar quieto, não conseguir ficar sentado, calado! lembro de todos os detalhes, do cheiro do desinfetante, do alcool, do papel... Lembro das cores da sala sem luz. As cores eram marrom, vermelho, preto. Eu não lembro de ter visto, eu lembro de ter sentido essas cores, elas apareciam na minha cabeça a cada soluço de choro. eu tateava todo o lugar com minhas mãos pequenas. Eu sabia onde estava a luz mas não conseguia apertar o botão, eu sabia onde era a porta mas não conseguia fugir, eu sabia quem estava do outro lado, as vozes eram nítidas, os sorrisos, a conversa, TUDO! 17:50, o barulho do fusca na porta da escola, enfim, vou fugir! abri a outra porta de baixo da escada, disparei em direçao ao portão pelo patio da escola, passei voando em frente a secretaria em direção ao fusca sem olhar pra trás, como um foguete entrei no carro, calado. Não lembro quando contei o fato em casa, não lembro se foi no mesmo dia, não lembro se foi na mesma semana, não lembro o dia... Só lembro que quando contei ninguem acreditou, afinal, eu era uma criança inteligente, com uma boa imaginação e criativa. Até hoje lembro de tudo, mesmo querendo esquecer. Até hoje... Eu odiava tirar fotos, quase nunca gostava do resultado, talvez eu tivesse medo de ver quem estava ali, até hj...

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Mala Vermelha...


Um dia comum, eu, me programava para minha primeira viagem, apenas a minha primeira viagem.

Fui à casa de minha mãe e pedi emprestado uma mala que era do meu pai que a minha mãe insistia em não me emprestar, pois dizia que ela guardava lembranças, lembranças de viagens que meu pai nunca tinha feito... Insisti em levar a mala, mesmo assim.

Eis então que entro no avião e não sentia nada, continuava tudo normal, não conseguia sentir nada, absolutamente, NADA...

Já ia me esquecendo, um amigo estava me levando ao aeroporto e me deu um livro que esqueci o titulo, mas o alto era: Gabriel Garcez, nunca tinha ouvido falar... Ao me entregar o livro ele disse: Quando ficar entediado, leia.

Passei 14 no avião com destino a França, assim que aterrissamos peguei o primeiro taxi para o hotel, eu não sabia, mas a CIA aérea levava a mala para o endereço do hotel, devia ser algum tipo de serviço que a CIA onde comprei a passagem fazia, quando cheguei no hotel e me dirigi ao balcão o atendente, um homem com seus 50 e poucos anos me encaminhou para meus aposentos, era um hotel simples, sem muito luxo, aliás, sem luxo algum, parecia um albergue... Ao chegar no quarto procurei minha mala e não a encontrei, me dirigi, novamente, ao balcão e perguntei:

- Senhor, onde está minha bagagem?

Ele respondeu:

- Que bagagem? essa que o senhor carrega?

Eu respondi, já irritado, é eu sou irritado por natureza:

- Claro que não, eu estou me referindo a minha mala vermelha que a empresa deveria ter entregue ao senhor...

Ele me olhou com uma cara arrogante e sorriu dizendo:

- Aqui não entregaram nada e nem avisaram nada, procure a CIA aérea.

Eu, já muito irritado e sem minha mala me dirigi ao aeroporto, chegando lá fui ao guichê da empresa que viajei e perguntei a atendente onde estava minha mala e ela respondeu:

- Todas as bagagens que vieram no seu voou já foram entregue, tem certeza que não está no hotel? Vou da uma olhada para ver se houve algum engano...

Eu, já muito puto, doido para quebrar a cara daquela mulher com sotaque irritante, me sentei e esperei ela voltar.

- Senhor, eu chequei com o pessoal de entrega e eles disseram que tudo que estava endereçado foi entregue, pode ter havido algum engano, iremos entrar em contato com as pessoas do voou, até lá o senhor pode esperar no hotel que entraremos em contato com o senhor assim que tivermos alguma resposta, preencha esse formulário descrevendo sua bagagem e o que tinha dentro dela...

Nem esperei a moça terminar de falar e disse:

- Caso não encontrem minhas coisas eu vou entrar com um processo contra vocês, eu estou em um país desconhecido sem roupa alguma...

Preenchi o papel enquanto ela tentava falar alguma coisa que eu nem prestei atenção, eu só queria ir embora dali.

Voltei para o hotel e fui dormir.

Paralelo a todo esse transtorno e voltando ao desembarque...

Uma moça loira chega a casa de seus tios depois de algumas semanas sem os ver, molhada, pois estava chovendo e enquanto ela "matava a saudade" sua tia disse:

- Sua mala chegou faz 2h, eu pensei que você viesse com eles...

- Minha mala? tudo que eu trouxe já está aqui comigo, deixe me ver.

Curiosa, foi entrando e percebeu que haviam mandado a mala pra pessoa errada, era a minha mala e que por algum motivo idiota tinha sido entregue nas mãos erradas, restava agora esperar pela boa vontade e honestidade dessa moça para devolver minhas coisas.

A empresa começou a ligar para as pessoas que tinham sido desse mesmo voou até que ligaram para a moça.

- Senhora, houve um engano na hora da entrega das malas e estamos ligando para todas as pessoas que viajaram no voou X, precisamos da ajuda da senhora, por acaso a senhora não recebeu uma mala vermelha com tamanho X por engano?

A moça então respondeu:

- Não senhora, não recebi nenhuma bagagem com essas características, mas espero que vocês encontrem logo, se precisarem de mais alguma coisa, podem entrar em contato comigo.

- Ok, senhora, desculpe incomoda-la.

- Disponha.

Ela se negou a devolver minha bagagem, o que ela queria e por que havia mentido?

Passou um dia e ela começou a mexer na mala, fuçar meus pertences, minhas camisas, calças, tênis e meu livro...

Os dias foram passando e a moça já havia voltado as suas atividades normais, ela era redatora de um jornal local. Ela todos os dias cheirava minhas roupas e já tinha começado a ler o livro, até que percebeu que estava "apaixonada" por mim e começou a imaginar como eu era, passava as horas de folga lendo meu livro e vestindo minhas roupas até que uma hora ela decidiu devolver a mala.

Dentro da mala tinha o endereço do hotel onde eu estava, mas não tinha meu nome, só o nome de meu pai numa etiqueta por dentro da mala, foi então que a moça se dirigiu ao hotel e perguntou ao balconista por meu pai, já que ela imaginava que o dono da mala era o mesmo que estava escrito na etiqueta, o atendente disse que não havia nenhum hospede com aquele nome, nos aposentos do hotel, então a moça, desiludida foi embora.

Logo em seguida a moça começou a tirar fotos com minha câmera, tirava fotos dela e de pessoas e lugares que ela frequentava, ela pensou até em publicar um texto sobre a mala vermelha.

Até que um dia, sem acreditar que eu não existia, ela, pega a mala e volta ao hotel, junto com as fotos e deixa no saguão do hotel, num lugar que todo mundo que entrasse no hotel enxergaria com facilidade, o dono do hotel e também balconista, viu a mala e lembrou do que o eu havia dito sobre a mala vermelha e quando eu cheguei, me perguntou se era aquela a minha mala e eu surpreso respondi:

- Onde encontrou a mala? quem trouxe?

Ele respondeu:

- Não sei, achei que alguém tivesse perdido, mas quando olhei direito para ela, lembrei do que o senhor havia dito sobre sua bagagem, então peguei e guardei ela comigo.

- Porra, como assim? o que será que aconteceu?

...

Agradeci ao dono do hotel e fui pro meu quarto com a mala, quando abri a mala vi algumas fotos, notei que minhas roupas estavam amassadas e meu livro não estava ali, comecei então a ver as fotos muitas delas turvas, noutras, varias pessoas e lugares diferentes, na maioria das fotos turvas tinha sempre a mesma moça, loira, branca, estatura mediana, mas não dava pra enxergar direito o rosto, mas, sempre que tinha ela nas fotos, tinha uma peça de roupa minha e notei também um sorriso no rosto dela. Vendo as fotos com mais calma comecei a perceber que pareciam pistas para eu encontra-la.

Peguei um taxi e pedi ao motorista que me levasse em alguns lugares das fotos e o motorista me levou tranquilamente, ele disse que todos aqueles lugares eram lugares fáceis e muito visitados, então comecei a analisar as outras fotos e a perguntar as pessoas se sabiam onde era os outros lugares, mais fechados, até que encontrei o lugar onde ela estava na maioria das fotos e fui até a casa. Chegando lá, bati na porta e uma senhora de uns 38 anos atendeu a porta, então eu perguntei se era ali que vivia a moça das fotos, ela, como era de se imaginar, ficou com medo e perguntou que eu era, foi então que expliquei toda minha história e ela confirmou os acontecimentos, mas, a moça tinha saido com um colega de trabalho, disse a sua tia.

Então, tive a seguinte idéia, tirei uma foto minha em um dos lugares que ela esteve e deixei na porta da casa dela, na foto dizia para ela ir até o local tal no dia tal e na hora tal.

O dia D havia chegado e eu estava ansioso para saber o que aquela moça tanto fez com minhas coisas e qual o por que de tanta obsessão, não vou negar, essa história além de ter me deixado muito curioso estava me deixando com tesão também, mas não era um tesão comum, era algo novo, algo que nunca senti, algo que não sei explicar.

Lá estava eu, sentado, nervoso, à espera da tal moça louca, quando de repente ela vem se aproximando e sorrindo para mim, como quem já me conhecia há séculos, eu, ainda nervoso, retribui o sorriso e num segundo enquanto nos aproximávamos no tempo em que chegamos bem perto, nos beijamos sem dizer uma palavra, depois do beijo, caminhamos na beira de um lago e jantamos num lugar perto dali mesmo que ela mesma indicou.

Após o jantar, bebemos um pouco mais e fomos para o hotel e lá no hotel, no quarto mais precisamente, acabamos transando e eu senti tudo que nunca havia sentido antes e logo que terminamos continuávamos a conversar quando ela falou:

- Adorei seu livro, eu te imaginava todo o momento por causa desse livro.

Foi quando eu sorri e disse:

- Não fui eu quem comprei, na verdade, nem li, quem me deu foi meu amigo, poucos minutos antes de eu viajar e me disse pra ler se eu me sentisse entediado por aqui, mas nem pude ler, você ficou com minha mala...

Foi quando um silêncio insuportável encheu o nosso quarto, ela fazia uma cara de decepção, foi então que perguntei:

- O que você está sentindo, parece ter se decepcionado comigo por eu não ter sido a pessoa que você pensava que fosse, por causa do livro...

ela, já olhando para o teto e debaixo do cobertor respondeu:

- Eu não sei o que estou sentindo agora...

Foi então que nos viramos e adormecemos, logo que amanheceu eu notei que ela estava se levantando, mas, não me acordou então preferi fingir que não vi nada.

No dia seguinte, havia chegado a hora de partir, eu, ainda sem entender muito o que estava acontecendo preferi nem ir atrás dela e foi assim que aconteceu, nunca mais nos vimos, nem tivemos mais contato...

quarta-feira, 2 de março de 2011

Insônia...


Noite passada, estava eu sem conseguir dormi, rolando pela cama, quando decidi dá uma volta pela casa.

Levantei e, com as luzes todas apagadas, caminhei em direção a porta do meu quarto, dei passos curtos e minuciosos, pois o breu tomava conta do ambiente... Aos poucos minha visão foi acostumando com a escuridão e já dava para enxergar o chão da sala de estar, então continuei a caminhar lentamente e fui em direção a cozinha quando escuto bem de longe o som de mastigadas, mas não era um mastigar comum, era algo do tipo roendo, só que lentamente. Minha curiosidade aumentava a cada passo que dava e o som aumentava na mesma intensidade quando de repente me deparo com uma figura sentada na mesa de jantar, a degustar, vagarosamente, uns biscoitos cream-craquer, que tinha deixado mais cedo ali na mesa. Era um ser de olhos avermelhados, pelos acinzentados, calda fina e longa, usava bigode e um chapéu a lá mordomo de filmes ingleses, tinha dois dentes pretuberantes e segurava uma bengala em seu braço direito.

Ao me ver, o sujeito tomou um susto e soltou o biscoito, no mesmo tempo em que fitara os olhos em mim, como quem estivesse com medo de minha presença, foi quando falei:
- Oi, tudo bem? O que faz ai sentado à minha mesa a esta hora?

Ainda, meio chocado e com as patas a tremer, respondeu com voz aguda e trêmula:
- Tudo e o senhor? Eu estava com fome e decidir sentar à mesa a essa hora, me desculpe se te acordei...

Puxei outra cadeira e sentei-me ao seu lado e disse, com ar de desdem...
- Hora... Eu estou ótimo, tirando essa insônia horrível que me persegue, estou ótimo e o senhor não me acordou, como disse, estou com insônia... Quer uma xícara de café ou chá?

O indivíduo, já mais calmo e já a roer lentamente sua bolacha, respondeu:
- Sim, sim, um pouco de chá por favor.

Levantei e fui até a prateleira e peguei uma xícara e uma colher, fui em direção ao fogão ascendi uma boca e coloquei água no bule para esquentar, nesse meio tempo perguntei ao rapaz qual era o seu nome.
- Me chamo mickey e o senhor?

- Eu me chamo Pedro Ivo, e dei um sorriso de brodagem para o rato.

- Sempre te vejo vendo tv ou no computador, mas sempre a noite, você faz o que durante o dia? Perguntou o rato.

- De dia eu trabalho, com computadores, montando, dando assistência as pessoas que não entendem muito e por ai vai e a noite eu faço faculdade, e o senhor, o que faz da vida? Qual sua idade?

- Eu?! Hummm, então, de dia eu quase sempre estou dormindo, geralmente acordo a noite para procurar comida, para mim e para minha familia, você já deve ter visto minha familia por aqui ( ele já usava o pronome "você" ao invés de "senhor" ).

- Sim, vi sim, sempre vejo seu filho passeando pela minha cozinha, como ele se chama e qual a idade dele?

- Ahh, aquele menino não tem jeito, o nome dele é Willi e ele tem 6 meses, você sabe que nós ratos vivemos em media 2 anos, aqui no Brasil né? Eu tenho 1 ano e 3 meses :D

- Hum, legal, então você só tem esse filho e sua esposa como se chama?

- Minha esposa se chama Minnie, ele tem 1 ano de idade e tínhamos mais 2 filhos, mas eles comeram algo envenenado e morreram :/

- Meus pêsames, mas então, você sempre viveu por aqui né?

- Sim, meus pais moravam aqui, eu nasci aqui e não pretendo me mudar, a comida não é lá essas coisas mas a gente sobrevive muito bem por aqui :D

No meio tempo da conversa a água já estava fervendo e eu me levantei pra preparar o chá e depois de pronto servi.

- Mickey, vou fumar um cigarro, tá afim?

Ele nem respondeu e já foi levantando com sua bengala e a xícara na outra mão, fumamos uns três cigarros enquanto conversávamos e foi quando o sono veio e eu me despedi dele e fui para minha cama, ao me deitar fiquei me perguntando sobre a comida que comia todos os dias, eu achava que me alimentava bem e o rato levantou essa questão que até hoje martela na minha cabeça, será que o que eu como é mesmo bom?